sexta-feira, setembro 24, 2010

Análise BPI: O Ano do Brasil

(Notícia do Diário Económico - Research BPI)
O Brasil volta a dar nas vistas, confirmando o seu estatuto de potência económica emergente: a maioria das previsões de crescimento económico para 2010 situam-se acima de 6,5%.


Nos últimos meses, a forte aceleração justifica-se por via da procura doméstica, suportada por dois catalisadores: mercado de trabalho e mercado de crédito, que têm sustentado níveis de consumo fortes. O desempenho do sector externo - motor de crescimento em anos anteriores - também tem vindo a melhorar, assente numa recuperação do mercado internacional das commodities. Daqui decorre que, os indicadores de actividade económica, que nos primeiros meses do ano apresentaram uma forte dinâmica, suportam a expectativa de uma forte taxa de crescimento real do PIB em 2010. Os dados do crescimento económico no primeiro trimestre serão conhecidos na próxima semana.

Esta forte aceleração da economia tem tido como contrapartida uma crescente pressão inflacionista, registando-se um aumento acentuado das expectativas de inflação, nomeadamente em 2011, colocando em causa o limite superior do intervalo-objectivo definido pelo banco central (4.5%+/-2%). Esta evolução levou a que na última reunião do banco central, fosse iniciado um movimento de subida da principal taxa de referência. O Banco Central do Brasil procedeu à subida da taxa de juro de referência em 75 pontos base, colocando a taxa Selic em 9.50%. Na próxima reunião, dia 8 e 9 de Junho, provavelmente será anunciada uma nova subida de 75 pontos base. A tentativa de conter uma espiral inflacionista passa também pela retirada de outras medidas de estímulo em termos de política monetária, nomeadamente procedendo à subida do coeficiente das reservas mínimas obrigatórias. Os mercados reagiram favoravelmente a esta medida mais agressiva por parte do Copom, na medida em que tal confirma o forte empenho das autoridades brasileiras no compromisso de defender a estabilidade dos preços.

Porém, têm persistido dúvidas quanto à eficácia destas medidas, uma vez que do lado da política fiscal, o governo tarda em dar sinais claros de retirada das medidas de estímulo introduzidos aquando da crise internacional. Ao invés, algumas das medidas introduzidas nessa altura e cujo prazo previsto de validade já findou, foram prorrogadas por mais alguns meses ao longo de 2010 (exemplo, o imposto sobre produtos industriais). De facto, o principal risco advém do lado das contas públicas. Os dados relativamente a Abril trazem algum conforto ao mercado. O saldo primário contrariou o movimento de queda dos últimos meses, beneficiando de um desempenho superior ao esperado do lado da receita fiscal, atingindo os 2.17% do PIB (v.s. 1.94% em Abril). Contudo, esta evolução é justificada do lado da receita, ao mesmo tempo que a pressão do lado da despesa se mantém intacta. Num contexto de forte aquecimento da economia, a tentação de manter a política fiscal expansionista num período eleitoralista pode levar a economia a entrar num ciclo vicioso, na medida em que aumentará as pressões inflacionistas e obrigará o banco central a uma política mais agressiva. A forte subida das taxas de juro coloca pressão sobre a moeda brasileira com implicações ao nível do equilíbrio do comércio externo; e por outro lado contribui para um agravamento do serviço da dívida pública. Impedir que esse ciclo vicioso ocorra é o principal desafio que se coloca ao governo brasileiro.

Nos próximos meses, o Brasil prepara-se para as eleições presidenciais de Outubro. O empenho de Lula da Silva na promoção da candidata oficial do Partido dos Trabalhadores, Dilma Rousseff, resultou numa escalada da candidata nas sondagens de opinião, anulando o fosso face ao candidato do PSDB, José Serra. A eleição Presidencial é sempre motivo de incerteza e gera alguma volatilidade no mercado. Mas face ao sucesso de Lula da Silva na prossecução de políticas pró-mercado e Dilma ser uma sua sucessora próxima, os riscos associados a esta eleição são diminutos, na perspectiva dos mercados. Porém, resta saber até que ponto Dilma será uma líder suficientemente forte para gerir as várias tendências (algumas mais radicais de esquerda) que fazem parte da coligação que a apoia e que Lula da Silva teve a capacidade de virar a seu favor na gestão dos seus governos.

Entretanto, apesar do contexto de euforia que ronda a economia brasileira, o real apresenta um movimento de correcção face ao dólar, transaccionando em torno de 1.82, aliviando do patamar 1.76 (valor mínimo do USD/BRL atingido este ano), o que se explica pelo fortalecimento da moeda-americana nos últimos tempos num contexto de maior aversão ao risco nos mercados internacionais. Contudo, não se pode falar de uma inversão de tendência, mas apenas de um movimento de correcção, sendo que as perspectivas favoráveis para economia brasileira e a subida de taxas de juro deverão sustentar perspectivas positivas para a moeda local.
(Créditos a: Departamento de Estudos Económicos e Financeiros do BPI)

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