domingo, fevereiro 28, 2010

Sobre os comentários ao texto "Nuvens no Horizonte"

Em primeiro lugar, quero agradecer a todos os que se deram ao trabalho de comentar o meu texto “Nuvens no Horizonte”, bem como a simpatia das palavras que me endereçaram sobre esta iniciativa. Agradeço também a todos os que pessoalmente ou através de mensagens privadas me felicitaram por este novo projecto.


Quanto aos comentários propriamente ditos, penso que, apesar de todas as dificuldades que atravessamos e que ainda teremos de atravessar, os portugueses acabarão por ultrapassar o reajustamento estrutural da economia portuguesa. Inevitavelmente, esperam-nos mais alguns anos de dificuldades, mas a reestruturação do modelo económico português acabará por ser feita, antes do final desta década. Acredito mesmo que, 2018 marcará o “fim da crise”no nosso imaginário colectivo, eventualmente com um pontapé de saída do campeonato mundial de futebol num estádio da segunda circular.

Por um lado, a crise orçamental do Estado, sendo recorrente na nossa história económica é também o resultado das governações de facilitismos do passado, especialmente as governações dos tempos de crescimento económico, com particular destaque para a década de 90. Utilizámos a folga que tínhamos para contrair obrigações em despesas correntes que, sem um cenário de inflação tornam-se agora difíceis de superar. Os direitos adquiridos do passado são nesta fase pesos mortos e gorduras que não desaparecem… Não deixa de ser curioso que o criador do monstro o tenha também baptizado em tom crítico!

Por outro lado, a nossa estrutura comercial externa é uma preocupação de longo prazo que continuará a reduzir a nossa tendência de crescimento do PIB Potencial.

Qualquer um dos dois pontos focados acima preocupam-me bastante mais que a notação de risco que as agências de rating nos atribuem nestes dias, afinal de contas passaram os últimos dez anos a cometerem erros de palmatória e a enganarem-se consecutivamente sobre as realidades económicas. Claro que pagaremos o dinheiro mais caro e isso vai sair-nos do bolso, mas a realidade económica espanhola é bem mais preocupante que a portuguesa e uma crise ao “estilo grego” é não só mais provável em Espanha, como teria consequências profundas no nosso país, aceleradas pelos mecanismos de transmissão potenciados pela integração económica ibérica actual.

Quanto ao futuro, é verdade que as gerações que nos sucederem terão muito provavelmente de se confrontar com um país de retaguarda para muitas actividades económicas, em que os melhores terão de sair de Portugal para prosseguirem as suas carreiras, mas isso resulta também da nossa pequenez de mercado. No entanto, ao mesmo tempo em que o Portugal da era industrial cai a pique, vai nascendo o Portugal plataforma logística e de serviços que marcará a década de 2020.

No entanto, é inegável que atravessar outra década de ajustamento estrutural é uma perspectiva extremamente desanimadora, em particular para quem termina agora os seus cursos universitários e desde criança que houve falar em crise. Infelizmente, não haverá muitas possibilidades de inversão nos próximos tempos. O modelo económico português não estava preparado para a competição global, nem aproveitámos os fundos comunitários que nos foram atribuídos precisamente para fazer essa preparação. Assim, restam-nos duas hipóteses: ou fazer este ajustamento até ao fim e aguentar não só a mudança, mas também as crises conjunturais que se vão sobrepondo; ou seguir o caminho “mais fácil” apontado por Olivier Blanchard, reduzindo o salário mínimo nacional para 150 Euros, afirmando que acabavam os nossos problemas com o desemprego, esquecendo-se que acabaria também toda e qualquer perspectiva de nos tornarmos numa economia desenvolvida, baseada em alto valor acrescentado, altas qualificações e remunerações compatíveis com alta produtividade. Para não comprometermos dessa forma o futuro dos nossos netos e bisnetos, prefiro que suportemos subsídios de desemprego de trabalhadores não convertíveis ao novo modelo para que estes possam mandar os filhos para as universidades e que no futuro tenhamos trabalhadores mais qualificados, por exemplo engenheiros em lugar de operários não qualificados, nas nossas indústrias.

domingo, fevereiro 21, 2010

Nuvens no horizonte

A recuperação económica parece começar a ganhar consistência nos Estados Unidos da América e em alguns países europeus, o que a prazo significará uma boa notícia para Portugal.

No entanto, esta realidade positiva demorará a chegar até nós e é importante neste momento perspectivar a conjuntura do espaço temporal que se aproxima. Neste caso, a compreensão do futuro próximo não é particularmente difícil, uma vez que basta pensarmos nas tendências fundamentais do período pré-crise para entendermos o que vão ser os próximos tempos. Há dois anos atrás, os países em desenvolvimento cresciam a um ritmo elevado, convergindo com as economias mais desenvolvidas e atingindo novos patamares de acesso a bens de consumo. Assistíamos, então, a uma enorme transferência de riqueza do Ocidente para os países emergentes, num inevitável movimento de recuperação de desequilíbrios ancestrais, que o processo de globalização potenciou. Ora, o clima de expansão económica significará o retorno a este cenário global. No entanto, Portugal está a viver, há quase uma década, um período de ajustamento estrutural em que indústrias baseadas em mão de obra intensiva e barata, para os padrões europeus, têm vindo a desaparecer, num processo de transformação estrutural no sentido de uma economia avançada baseada em alto valor acrescentado. Infelizmente, este ajustamento do modelo económico português ainda vai demorar mais alguns anos a estar completo e consequentemente a podermos sentir os seus efeitos e benefícios. No entretanto, somos confrontados com o encerramento de unidades produtivas com centenas de trabalhadores, enquanto as novas unidades baseadas no conhecimento utilizam menor quantidade de recursos humanos ainda que com produtividade incomparavelmente superior. Assim, a subida do desemprego e os desequilíbrios sociais inerentes são inevitáveis.

A retoma económica levará ao aumento da procura nos mercados mundiais, significando o retomar da escalada dos preços interrompida temporariamente pela crise financeira internacional vivida nos dois últimos anos.

Este é um elevado risco que nós portugueses corremos: ser apanhados por este movimento generalizado de subida dos preços, com especial destaque para o petróleo, os produtos alimentares e a generalidade dos bens essenciais, numa fase em que a retoma económica ainda não se faz sentir na esmagadora maioria dos lares portugueses, em que o desemprego continuará a aumentar e os orçamentos familiares continuarão em contenção. Neste cenário, com a conjugação destes factores, a perda de poder de compra, natural em tempos de crise, será temporariamente agravada pela conjuntura internacional, podendo vir a representar uma perda total entre os vinte e os trinta por cento dos cabazes de compras dos portugueses, durante este ano e o próximo.

Este é um cenário que não nos pode apanhar desprevenidos!

Armadilha da Liquidez

Não raras vezes, durante os últimos meses, temos assistido às sucessivas quedas nas taxas de juro, quer no que diz respeito às taxas de referência para os mercados monetários, quer no que diz respeito às taxas Euribor para o caso dos empréstimos interbancários. Ainda no passado dia 5 de Março, Jean-Claude Trichet anunciou que a taxa de referência para a Zona Euro seria de apenas um e meio por cento, cortando assim meio ponto percentual face ao mês de Janeiro.

Ora, tendo em conta a actual conjuntura económica, estes cortes sucessivos deveriam funcionar como um estímulo para a supressão da crise. Presenciamos, porém, que o perigo da economia norte-americana cair numa armadilha da liquidez é cada vez mais real.



Podemos afirmar que estamos em presença de um cenário macroeconómico de armadilha da liquidez sempre que a taxa nominal de juros (aquela que resulta da actividade do banco central) for tão baixa e a expectativa desta subir tão elevada, que resulte numa sensibilidade infinita entre a procura de moeda e a própria taxa de juros e, por conseguinte, as pessoas serão levadas a preferirem reter a liquidez.

Aliás, o famoso economista Keynes, pioneiro na análise teórica do cenário macroeconómico de armadilha da liquidez, definiu a mesma quando se presencia o facto do aumento de moeda cair numa armadilha ou, dito de outra maneira, quando as pessoas e os demais agentes estão dispostos a terem mais moeda, ou seja, mais liquidez, quando se verificar uma taxa nominal de juros com valores próximos de zero. Numa situação destas, a eficácia das políticas económicas está posta em causa, nomeadamente no que diz respeito ao uso da política monetária (variações da taxa de juros, injecção de liquidez no mercado, etc.) uma vez que, nesta situação, a política monetária torna-se ineficaz e, por outro lado, a política orçamental (aumento dos gastos do estado), que perante esta situação deveria ser responsável pelo aumento do produto, na prática, também estará condicionada, uma vez que a taxa real de juros (taxa nominal de juros deduzida da inflação) será mais elevada devido à desinflação verificada e às taxas de juro bastante reduzidas.

Efectivamente, tendo em conta o cenário de recessão económica de que tanto se fala, os respectivos bancos centrais das economias mais poderosas, nomeadamente Reserva Federal Norte-Americana, Banco Central Europeu e Banco do Japão, não hesitaram em baixar as suas taxas de juro de referência como uma medida fulcral para a estimulação dos mercados financeiros e monetários e, consequentemente da economia real, no objectivo primordial do combate à crise económica e social que se verifica. Primeiramente, Ben Bernanke, responsável máximo do FED, optou por cortar as taxas de juro de referência para o mercado americano, de modo a ir ao encontro da estabilização dos mercados e das bolsas e, também, incentivando a recuperação económica. É ainda de salientar, com a ajuda do gráfico abaixo indicado, que os sucessivos anúncios dos cortes nas taxas norte-americanas resultaram, numa taxa nominal de juro praticamente nula, algo nunca antes visto nas estatísticas da economia americana. A nível europeu o cenário não difere do panorama americano; apesar de actualmente existir um diferencial entre as duas taxas de referência, que é de, aproximadamente, dois por cento, o certo é que existe em comum o facto do BCE, liderado por Jean-Claude Trichet, ter adoptado a mesma acção, isto é, sucessivos cortes significativos nas suas taxas de referência para os mercados europeus. Aliás, o facto de se verificar um conjunto de medidas idênticas por parte da Europa e dos EUA, poder-se-á justificar com a cada vez maior interdependência económica a nível internacional, já há muito defendida por inúmeros economistas, podendo-se salientar o último prémio Nobel da Economia e académico na área da economia internacional, Paul Krugman.



Fonte: FED e BCE.





Tendo em conta as últimas estatísticas oficias de organismos como o Eurostat, existe ainda outro aspecto que preocupa seriamente muitos economistas e restante classe política, ou seja, o cenário de desinflação (que significa uma queda dos níveis de preços). Mais grave ainda será o cenário de uma transformação de desinflação para deflação, o que, perante tais acções dos respectivos bancos centrais das principais economias ou blocos económicos, poderá resultar num aprofundar da actual crise para uma situação macroeconómica bastante complexa. Tão importante como analisar quais as origens de uma grave crise económica, é ter em mente quais as medidas certas a implementar para combatê-la. Deste modo, e como anteriormente referido, um cenário de liquidity trap será, muito certamente, sinónimo de dificuldade na aplicação das políticas orçamentais e monetárias. De facto, a perturbação no uso das políticas monetárias irá-se prender com o facto das taxas nominais de juro estarem a atingir mínimos históricos, o que causará uma ineficácia desta importante política caso se continue a verificar a direcção das taxas de referência dos diversos bancos centrais.

Por ouro lado, haverá também um risco relacionado com a implementação das políticas fiscais no sentido em que a conjugação da baixa das taxas de juro e o cenário de baixa do nível de preços, que significará taxas reais de juros relativamente elevadas o que, por sua vez, impedirá os respectivos formuladores de política económica de aplicarem as suas políticas orçamentais como um valioso meio para combater a queda do PIB.

Mais uma vez, pegando no caso preocupante dos EUA, que actualmente apresentam taxas de referência próximas de zero por cento, convém não esquecer a velha lição para a Europa e para o mundo; uma vez que a economia norte-americana está prestes a cair numa situação de armadilha da liquidez, todas as economias mundiais terão de redobrar esforços no sentido em que, certamente, se irá manter a avareza em matéria de importações o que, como nos mostra o passado, será o acender do rastilho para uma crise sem fim à vista. A esperança transmitida pela nova administração americana, presidida por Barack Obama, terá uma árdua tarefa na condução de políticas macroeconómicas uma vez que, caso estas sejam mal conduzidas, convém reter as sábias palavras do famoso economista do MIT – Massachusetts Institute of Technology –, Olivier Blanchard, quando este afirmou que os economistas são, no fundo, como os oncologistas: já descobriram muito mas ainda não descobriram tudo o necessário para salvar vidas…

Artigo escrito em Setembro 2009, por:
Mário Fernandes e José Paulo Oliveira
Investigadores do Observatório Lusófona de Actividades Económicas (OLAE) - Centro de Investigação da Universidade Lusófona



Para descarregar o ficheiro original clique em:
http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1493787

Fontes de Financiamento para o Desenvolvimento

A necessidade de repensar as fontes de financiamento para a Ajuda Internacional ao Desenvolvimento emergiu como uma consequência inevitável da conferência do Milénio das Nações Unidas, em Setembro de 2000, em que foram adoptados os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio. Para atingir este conjunto de objectivos no ano 2015, será necessário, segundo o Relatório Zedillo, aumentar o volume actual de Ajuda em 50 mil milhões de dólares anuais, o que poderá ser feito duplicando o valor actual da Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) do Comité de Ajuda ao Desenvolvimento (CAD) ou encontrando fontes alternativas de financiamento.

Os líderes dos Países Desenvolvidos comprometeram-se a aumentar a APD em percentagem do PIB, da situação actual para uma média de 0.29 por cento do PIB dos países membros do CAD, em 2006. A APD representa um papel fundamental no desenvolvimento dos países com menos recursos, até porque são estes países que recebem menos capitais privados. Nos países menos avançados (PMA) os fluxos de capitais privados ficam-se pelos 3.64 por cento do PIB, muito abaixo dos valores dos países mais avançados.

Peso da Ajuda no PIB, 2002

(em percentagem)

Mundo 0.22

OCDE -

Sudeste Asiático e Pacífico 0.41

África Subsaariana 6.32

Países Pobres Altamente Endividados (PPAE) 8.95

Países Menos Avançados (PMA) 8.69

Fonte: BANCO MUNDIAL World Development Indicators 2004

Dada a ineficiência passada da APD, os países doadores começaram a sentir “fadiga da Ajuda”, como resultado em termos reais o auxílio ao desenvolvimento tem vindo a diminuir em percentagem do PIB dos países desenvolvidos.

É hoje reconhecido que, a utilização da condicionalidade (imposição de uma série de condições incluindo algumas de natureza política para concessão de Ajuda) não conduziu a melhores políticas, não acelerou o crescimento nem produziu melhores resultados. Existindo agora uma tendência para a Selectividade, ou seja seleccionar os países a ajudar com base nas provas dadas no passado.

Muitos países são demasiado pobres e/ou estão demasiado endividados para financiarem a sua transição para uma situação de desenvolvimento sustentável e nalguns casos as transferências de fundos de poupança doméstica em direcção aos países desenvolvidos, muitas vezes fundos apropriados pelas elites locais (incluindo os recursos que resultam da ajuda externa), com base em corrupção e outros meios ilegais, leva à necessidade de fundos externos para financiarem o seu desenvolvimento.

Os países em estádios iniciais e médios de desenvolvimento necessitam de amplas entradas de recursos financeiros que complementem as poupanças domésticas para financiar o investimento e consequentemente o crescimento económico. Uma vez que o problema do desenvolvimento económico está intimamente ligado à questão da redução da pobreza, observamos que o crescimento económico é a forma mais segura de retirar da miséria o maior número de seres humanos, pois o crescimento económico tende a beneficiar proporcionalmente todos os estratos sociais, incluindo o quinto mais pobre da sociedade, podemos afirmar que o crescimento é bom para os pobres, sendo a chave para a redução da pobreza.



O fenómeno da Globalização levou ao aumento dos fluxos de IDE com a perspectiva de produção multinacional, com divisão internacional do trabalho, beneficiando da redução de barreiras ao comércio e investimento internacional. Ao mesmo tempo, importantes inovações tecnológicas, no campo das telecomunicações e das tecnologias da informação facilitaram a coordenação das redes internacionais de produção (aumento da eficiência produtiva). Os mercados financeiros internacionais aumentam a eficiência e os lucros devido à divisão internacional do trabalho. O crescimento económico nos países emergentes é realçado não só pela disponibilidade de capital estrangeiro mas também pelo desenvolvimento dos centros financeiros locais que fazem a ponte com os mercados internacionais.

O IDE conduz a melhores práticas de gestão e potencialmente gerará “spillovers” tecnológicos que contribuem para o desenvolvimento económico. Os benefícios da globalização financeira são mais visíveis nos países em desenvolvimento com maior capacidade de absorção, logo para obterem maiores vantagens da integração financeira global os países devem procurar aumentar a sua capacidade de absorção. A capacidade de absorção de um país corresponde à quantidade de recursos financeiros que o país consegue utilizar para obter crescimento económico. A boa governação é um factor decisivo, condicionante da capacidade de absorção. Por outro lado, existe uma correlação positiva muito forte entre corrupção e má governação nos países em desenvolvimento.

Para atingir os Objectivos do Milénio, o Banco Mundial propõe uma solução com duas vertentes: Duplicar os actuais fluxos de Ajuda e realizar um novo compromisso com a “boa governação” por parte dos países receptores.

De entre as fontes alternativas de financiamento, podemos destacar as seguintes: aplicação de uma taxa sobre as transacções cambiais, apresentada por James Tobin ; criação de uma taxa “tipo Tobin” sobre as restantes transacções financeiras e a proposta de emissões especiais de Direitos de Saque Especiais (DSE) para doação aos países em desenvolvimento, apresentada por George Soros.

Segundo James Tobin, a excessiva mobilidade internacional dos capitais privados é o principal problema do sistema monetário internacional. O estabelecimento da convertibilidade completa entre as várias moedas e a desregulamentação dos mercados financeiros permitiu que os capitais financeiros se movimentassem rapidamente de um país para outro, em busca de uma maior rendibilidade, o que tem um enorme efeito limitador sobre a política monetária de um país.

Tobin, em 1978, apresentou duas soluções para os problemas causados pela mobilidade do capital. A melhor solução seria uma total integração económica global com uma moeda única comum e com políticas económicas comuns. Esta solução óptima fica reservada para o futuro.

Assim, Tobin apresentou uma solução alternativa que consiste na aplicação de uma taxa sobre as transacções cambiais. A aplicação da taxa Tobin será uma solução “second best” pois a melhor solução seria acabar com a especulação (com os seus efeitos nocivos) mas como não podemos acabar com esta distorção (especulação), introduzimos outra distorção (taxa) para diminuir os efeitos da primeira distorção. Obtemos, assim, uma solução “second best”.

O objectivo da taxa Tobin é lutar contra as flutuações excessivas das taxas de câmbio, ou seja as flutuações da taxa de câmbio que não têm relação com a situação da economia produtiva mas que a perturbam.

Segundo a teoria económica, as taxas de câmbio deviam ser determinadas pelos indicadores fundamentais das economias. Ora, estes indicadores fundamentais das economias são relativamente estáveis, enquanto os dados empíricos sobre as taxas de câmbio flexíveis mostram uma muito maior volatilidade do que os indicadores fundamentais.

A criação de um espaço de não transacção criado pelo custo da taxa permitiria uma maior diferença de taxas de juro entre os países, sem correrem o risco de ataques especulativos, o que abriria espaço para políticas monetárias mais interventoras, possibilitando ajustamentos na taxa de juros com o propósito de afectar o consumo, a poupança e o investimento interno sem implicar alterações na taxa de câmbio.

A autonomia política funcionaria apenas dentro dos limites alargados pelo efeito da taxa, fora destes limites o sistema continuaria a funcionar da mesma forma da actualidade. Este efeito é exemplificado pela figura, mostrando a existência de uma zona de não transacção provocada pela introdução de uma taxa Tobin, definida em torno do valor fundamental de mercado da taxa de câmbio, situada entre os limites inferior e superior. Apenas fora desta zona de não transacção, os especuladores teriam interesse em operar.

Zona de não transacção criada pela introdução da taxa Tobin



Entretanto, foram apresentadas outras propostas de criação de taxas globais com o objectivo de angariar fundos para a ajuda ao desenvolvimento dos países pobres, incluindo a implementação de uma taxa tipo Tobin sobre as restantes transacções financeiras em complemento da proposta de James Tobin, a criação de uma taxa ambiental sobre as emissões de dióxido de carbono, financiando bens públicos globais através da criação de taxas sobre alguns “males públicos globais”, tais como os movimentos de dinheiro sujo, a poluição ou as vendas de armas.

Perante as taxas globais, existe outro tipo de questões que não podemos esquecer, devem as taxas contribuir para acabarem os “males” sobre os quais incidem? Acabando por gerar receitas cada vez mais pequenas e tendendo para zero ou devem maximizar as receitas, acabando por sobreviver à custa da existência desses “males”? Devem os estados obter receitas, aplicando taxas sobre actividades pouco recomendáveis (ainda que não ilegais) como a especulação financeira, ainda que essas receitas sirvam para financiar bens públicos globais?

Nenhuma resposta parece ser definitiva.

George Soros apresentou uma proposta com o objectivo de aumentar a ajuda internacional ao desenvolvimento consistindo em emissões de DSE para doação, pelos países ricos, aos países em desenvolvimento.

Os países em desenvolvimento beneficiariam directamente, através da adição às suas reservas monetárias, e indirectamente, com o fornecimento de bens públicos à escala global.

A proposta de Soros centra-se na doação de 21 mil e 433 milhões de DSE, correspondentes à emissão de DSE autorizada pelo FMI em 1997 e que ainda espera por luz verde dos EUA, complementada por doações anuais de DSE, caso a primeira emissão seja aplicada com sucesso. A emissão especial proposta corresponde aproximadamente a 0,1% do PIB global, portanto a dimensão das emissões poderia aumentar, havendo mesmo necessidade de emissões regulares de DSE para financiar os países em desenvolvimento, segundo Stiglitz.

Do atrás exposto resultam valores previsionais de receitas que poderão representar fontes alternativas de financiamento para a Ajuda Internacional ao Desenvolvimento, conforme as três propostas analisadas.

Valor Previsional de cada Proposta

(em milhões de dólares)

Taxa Tobin sobre as transacções cambiais 40 000

Taxa tipo Tobin sobre as restantes transacções financeiras 40 000

Doação de Direitos de Saque Especiais 31 227





Individualmente, qualquer uma destas propostas representa entre 60 a 80 por cento da verba necessária, o que seria uma contribuição decisiva para o sucesso dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, observemos que para os conjuntos de países mais pobres, o impacto da aplicação de qualquer uma destas propostas é muito significativo, pois os valores da Formação Bruta de Capital Fixo situam-se entre os 40 e os 60 mil milhões de dólares anuais para os PMA, os PPAE ou para os Países da África subsaariana o que reflecte a dificuldade que estes conjuntos de países têm em progredir.

A aplicação destas propostas será um sucesso em termos do estrito cumprimento do objectivo de obtenção de receitas.

No entanto, pelo que atrás ficou exposto, parece evidente que não basta aumentar os recursos disponíveis para o auxílio aos países em desenvolvimento, sendo decisiva a forma como esses recursos são aplicados. A má governação, corrupção e o desbarato dos fundos internacionais é mais do que aparente, sendo necessária outra abordagem para garantir que o dinheiro dos contribuintes dos países ricos enviado para os países em desenvolvimento, serve os interesses daqueles que mais precisam e não acaba por regressar às praças financeiras mundiais, de maior importância (e/ou Off-Shores), fazendo o percurso de regresso tituladas por membros de elites locais corruptas que enriquecem à custa do aumento do sofrimento dos cidadãos dos seus países.

A solução ideal parece ser a existência de um governo mundial que, administre directamente a aplicação de fundos públicos globais, com a existência de uma moeda única global e de leis globais.

Os países com mais pobreza, melhor governação, maior transparência e com um ambiente macroeconómico favorável devem ser os mais ajudados, com o objectivo de conseguir melhores resultados a curto prazo e influenciar os restantes a alterarem as suas práticas.

A forma como os fundos para o auxílio internacional ao desenvolvimento são aplicados deve constituir a preocupação primeira quando, generosamente, reflectimos sobre a melhor ideia para aumentar esses fundos, pois o aumento de fundos para o financiamento do desenvolvimento sem enormes progressos na forma como são aplicados resultaria numa oportunidade perdida, condicionadora do futuro da humanidade. O que seria imperdoável.




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http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1506080