Artigo de Opinião
Rui Seybert Pinto Ferreira
Como qualquer empresa, também um país vive de um plano de negócios. Um país, tem vendas e mercados, clientes, custos, lucros, prejuízos, amortizações e uma força laboral, que são os seus cidadãos.
Desde 1974, o plano de negócios de Portugal têm sido de recuperar dos choques sistémicos que destruíram imenso valor acumulado, destabilizaram a sociedade e a cadeia de valor produzida em Portugal.
Escrevo, recuperar pois, primeiro, não o foi e, segundo, nada muito auto sustentável foi criado em substituição do que havia.
Depois de um período prolongado de estabilização política e de um empobrecimento via uma inflação alta e desvalorização do Escudo, o que sim foi feito, foi uma transferência maciça de meios financeiros da UE com uma correspondente descida da inflação e dos juros.
Esses fundos foram investidos em infra-estruturas, formação e em financiar o período entre a perda de uma base económica e a criação de outra.
Só que no processo houve exageros como houve exageros noutras economias e por outras razões.
Os exageros foram, por exemplo, um aumento substancial da qualidade de vida à custa de um endividamento do Estado e dos privados para além da sua capacidade de criar riqueza (produtividade); um investimento excessivo em infra-estruturas que não pagam dividendos em efectivo para repagar dívidas; em formação que não é valorizada nem renumerada pelo mercado laboral.
Ora isto é o passado e bem conhecido por muitos.
O que ainda não é muito discutido, é que Portugal desde a criação do Euro e alargamento da UE para o Leste, entrou na fase de viver por si e pelos seus próprios meios.
Assim, Portugal atrai capitais e investimentos com base naquilo que produz e vende. Vive com as receitas e rentabilidade dessas vendas.
Para investir e produzir riqueza é preciso, e faz todo o sentido, pedir dinheiro emprestado. Só que quem pede dinheiro emprestado está a prometer repagar os fundos e os que emprestam estão a apostar na credibilidade do credor em o fazer.
E é esta credibilidade que se evaporou com a crise financeira da Grécia. E é esta falta de credibilidade, que os políticos tanta dificuldade têm em reconhecer. Afinal, eles foram eleitos e são pagos exactamente para dar credibilidade ao país. Credibilidade é liderar com convicção. Ora a falta de credibilidade equivale a uma falha política. Se os políticos reconhecessem a falta de credibilidade do seu país, estariam a passar a si próprios um atestado de incompetência. E os mercados financeiros estão aí mesmo para isso. Os mercados financeiros (câmbio, fluxo de capitais, juros) são uma constante certificação de como está a ser julgada a credibilidade dos políticos do país. Daqui se explica o 'ódio' dos políticos aos mauzões 'especuladores'. São estes que andam com o espelho na mão e forçam os políticos a olharem-se no espelho.
É imperativo que a consciência nacional absorva este conceito da falta da credibilidade.
Não são números, projecções, orçamentos, promessas, nem boas vontades e actos simbólicos que vão ajudar Portugal distanciar-se da crise na Grécia.
São-no actos e decisões que provam a seriedade e a convicção de fazer as coisas certas. Para provar isso, muitas vezes têm que se ir para além do estritamente necessário. Isto porque a credibilidade uma vez perdida ou em dúvida, custa a ser recuperada. Todos nós sabemos que somos desconfiados e a desconfiança custa a ser ultrapassada. Qualquer banqueiro que passa por um ataque de liquidez (fuga dos depósitos) sente bem na pele o que é a sua credibilidade; quanto custa a ganhá-la e quanto depressa se a pode perde-la
Mercados financeiros de países não escapam a estas regras. Isto porque os mercados financeiros são feitos por indivíduos e a mente humana reage aos mesmos estímulos no grande e no pequeno, no abstracto e no prático.
Políticos que manipulam o seu eleitorado vendendo peixe por carne e prometendo que é possível ter o bolo e comê-lo, estão a viver à custa da credibilidade do país. Estamos no momento em que já só saiem umas gotas da fonte da credibilidade.
O que Portugal necessita agora são políticas que voltem a aumentar o nível de credibilidade nos mercados financeiros.
Isto porque está claro que a liquidez que o Estado precisa, não só é para cobrir os gastos correntes, mas também para repagar o que amortiza do passado e têm que ser reembolsado. Ora, como não há dinheiro para o fazer, o que amortiza têm que ser refinanciado e para isso o Estado têm que ser credível.
Credibilidade não se ganha fazendo greves nem financiando projectos megalómanos. Ganha-se cerrando os dentes, lançar-se ao trabalho, viver-se com o que se têm e esperar por ter poupanças para as gastar depois de investir o necessário para manter o seu nível de vida. Este é o modelo alemão.
O Estado muito contribuiria se tivesse a coragem de convencer os seus cidadãos, que a melhor maneira para enriquecer e ganhar credibilidade é, por um lado, taxar o consumo dos cidadãos e limitar a despesa Estatal e, por outro lado, aumentar a receita dos cidadãos promovendo a produçao e a receita.
Muito se pode fazer em Portugal para isto e já.
Desde os anos 80, que o Estado se concentra na redistribuição da receita nacional e não na sua criação. É aqui que os nossos melhores e mais bem conceituados economistas falham. Não tem criatividade, não têm inspiração, não sabem; ou será que não acreditam?
Se Portugal não quer uma solução 'grega', não pode somente dizer que não está tão mal como a Grécia.
Se Portugal afirma que não é um caso 'grego', então como pode argumentar que mais vale esperar, como é que a Alemanha lida com os gregos e depois ir 'de carrinho'?
De cada vez que é aprovado em princípio um novo 'pacote' para a Grécia, a Alemanha exige mais cortes e medidas reestruturantes.
Porquê?
Exactamente porque o que está em causa não são números, mas a credibilidade de viver largos anos com medidas que recuperam a competitividade do país.
Se tivesse credibilidade, a Grécia não tinha nenhum problema em pedir o dobro de Euros à Alemanha. E a Alemanha dava de bom grado.
Portugal faria bem em antecipar-se e ganhar essa credibilidade antes de ter que pedir dinheiro. Não acredito que o dinheiro que venha a ser disponibilizado, seja uma prenda ou emprestado 'de boa vontade'. O financiamento vai doer e doer a sério. Mais, as condições vão ser impostas por terceiros fora de Portugal, sem ter em conta a mente, a cultura nem os interesses dos portugueses. Portugal vai-se sentir injustiçado. Vai haver correntes sociais desmotivadas e desmoralizadas. Em vez dos seus cidadãos remarem todos na mesma direcção e ultrapassarem rapidamente as dificuldades, vai haver contestação e demagogia. O país vai perder e em vez de manter a sua soberania e aproveitar a sua plataforma euromundista, vai-se tornar numa província retrógrada, marginal e abandonada da UE. Basta olhar para alguns estados no centro e sul dos EUA, para ver para aonde Portugal caminha se estiver nas mãos de um centro de redistribuição fiscal.
O que está neste momento em causa, não é a resolução de um problema de curto prazo; não é uma crise de liquidez; não é sermos ou não uma 'Grécia'.
O que está em causa é o que Portugal quer ser. Para querer ser, é preciso ambição, para ter ambição é preciso lutar, para lutar é preciso coragem, para ganhar, é preciso ter credibilidade.
Vamos a isso. Ao trabalho e mostremos que não somos 'gregos'. Portugal iria ser inundado por capital e não vão faltar oportunidades.
A emergência dos BRICS e a diminuição do peso dos G8 é uma oportunidade única e dourada para capitalizar os seus 800 anos de história Euromundista.
Não fiquemos à espera de uma solução 'grega'. Portugal têm que buscar a sua própria solução.
Tem que mostrar que é mais credível do que à Grécia
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